Já lá vão 5 anos desde que escrevi esta história. Curioso, como o tempo passa.
À laia da programação da RTP à tarde durante o Verão, decidi de vez em quando recuperar um enlatado para postar aqui.
Não é o meu favorito, mas anda lá perto.
Espero que gostem.
Era de noite.
Ao volante do seu Batmobile, o Batman perseguia o Joker a alta velocidade. A estrada era sinuosa, curva-contra-curva; circulavam na estrada de Vila Pouca de Aguiar para Vidago.
A cada curva no limite, Robin agarrava-se cada vez com mais força ao banco do batmobile.
Era a noite de 9 de agosto, dia de festa na Vila Meã. Roberto Leal acabava mais um concerto de verão, com o público em apoteose.
Mais tarde, com toda a equipa do cantor dentro do autocarro de digressão, Roberto Leal decidiu ir a pé até à pensão; a noite estava muito agradável e não lhe apetecia ir de imediato para cama.
Mais tarde descobriu tratar-se de uma infeliz decisão.
O Joker tinha desenvolvido um protótipo de automóvel mais rápido que o Batmobile;
de tal forma que cada vez mais o Batman perdia o Joker de vista.
Perto da curva da fonte, o carro do Joker passa a numa bisga incrível pelo Roberto Leal. Este, num instintivo acto infeliz, deu dois passos para dentro da estrada para tentar identificar o bólide. O espanto foi tal que chegou a falar sozinho:
- Pô , esse cárro ânda prá cará...
Não acabou a frase antes do Batmobile o atingir.
Antes de caír redondo e em peso no chão, elevou-se pelo menos a 5 metros de altura.
Batman travou a fundo. Rapidamente caíu em si e olhou pelo retrovisor:
- Robin, acho que atropelei alguém.
- De certeza? Vi uma mancha branca, não seria um saco de plástico?
- Não, tenho quase a certeza de que era uma pessoa.
- Vou lá ver.
Robin saíu do carro e dirigiu-se ao local onde estava o inanimado Roberto Leal.
Quando lá chegou, debruçou-se para lhe sentir a pulsação. Não pôde deixar de reparar no crucifixo ao pescoço do acidentado e na Bíblia meio saída do bolso:
- BAAATMAAAANN!
O Batman saíu do carro para ir ao encontro de Robin. Robin tinha fugido a correr, pelo que se encontraram a meio do caminho.
- Diz , Robin!
- Batman , eu...
- Vá desembucha.
- Acho que atropelaste o Papa!
- O PAPA??!? Mas que ideia estapafúrdia!! O Que raio estaria o Papa a fazer nesta estrada, e logo à noite? Onde é que tens a cabeça?
- Olha, para começar, conheces muitos homens que se vistam de branco, com crucifixos ao pescoço e bíblias no bolso?
- Por acaso não, mas duvido que o Papa seja o único homem no mundo com esses atributos.
Roberto jazia na estrada.
- Pois , o Sr. Batman tem sempre razão, o Sr. Batman nunca se engana.
- Robin, puto, não comeces com isso, sabes bem que às vezes és um pouco, vá... tapadinho.
- Ai, é? Estás a chamar-me de burro, Batman?
- Sim... e não. Não é isso.
- Então, o que queres dizer, afinal?
- Opá, ainda no outro dia faltou a luz na batcaverna e tu disseste "já viste como anoiteceu de repente"?
Roberto jazia na estrada.
- ORA BOLAS! ENTÃO SE NÃO HAVIA LUZ É PORQUE O SOL SE PÔS!
- Puto, aquilo é uma caverna. É a "batcaverna". Uma caverna, pá. Uma coisa onde não entra o sol...?
- É INJUSTO! QUANDO DISSE ISSO TINHA 13 ANOS! AINDA ERA MUITO NOVO!
- Sim, Robin. E ainda tens 13 anos, foi anteontem...
Roberto jazia na estrada.
- E DEPOIS? SABES QUE MAIS? A CULPA É TUA!
- Mau, o que tenho a ver com isto, agora?
- Olha, aqui há anos ias ao meu quarto todo nu e apagavas as luzes! Depois dizias "Já reparaste como anoiteceu de repente"?
- Águas passadas. Esquece, pronto.
Roberto jazia na estrada.
- NÃO ESQUEÇO NÃO! E agora me lembro... para que levavas a garrafa de vinho? É que não me lembro do que acontecia depois...
- Ahhh esquece lá isso. Alem do mais, já te contei como é a verdadeira amizade entre homens crescidos, certo? Olha, fica aqui que eu vou mas é ver do homem.
Batman despachou-se em direcção a Roberto Leal quando este começava a recuperar os sentidos.
Batman debruçou-se e perguntou-lhe:
- O Senhor está bem ?
Roberto, combalido e com o maxilar partido respondeu-lhe o melhor que pôde, arrastando a voz:
- Nã..ãã..o.oo. Peela.. graça...di.....Deus.....Noxa.. Sra...Fátxima...
Batman levantou-se rapidamente e com os olhos arregalados fitou o infinito.
A andar às arrecuas, rapidamente foi ao encontro de Robin. A Falar entre dentes, disse-lhe:
- Robin, acho que tens razão. Atropelei o Papa.
- Nãããão!!! A séééério???
- Oh Meu Deus! Atropelei o Sumo Pontífice!! Que tragédia , que horror!! Que... Que ... Que dirão os jornais de mim amanhã?
- Calma Batman! Vamos pensar no melhor a fazer, ok ? Tem calma!
Roberto jazia na estrada.
Batman, com as mãos nas ancas, desesperadamente andava para cá e para lá.
Ocasionalmente levava as mãos à cabeça, esmurrava o tejadilho do Batmobile e pontapeava o pneu.
Roberto jazia na estrada.
Batman continuava:
- Que fazer? O que vou fazer? A minha reputação, nem quero pensar!
Nisto, aproximou-se a grande velocidade um autocarro – o do Roberto Leal- os colegas de banda procuravam-no, apreensivos por ainda não ter regressado.
Só tarde de mais o condutor do autocarro viu o Batmobile preto. Desviou-se dele com uma guinada violenta, mas não conseguiu evitar passar com o autocarro por cima do cantor.
Batman aproveitou logo:
- Robin, vamos embora !! Estes gajos que fiquem com a culpa!!
E rasparam-se no Batmobile sem que ninguém conseguisse identificar o carro.
Meses depois, no escritório da sua mansão, Bruce Wayne tentava desenvolver um carro mais rápido que o do Joker. Albert, o mordomo, abriu a porta do escritório e disse:
- Está aqui um Senhor para vê-lo, patrão.
Pela porta entrou Roberto Leal, com algumas cicatrizes ainda visíveis.
Albert deixou-os e Bruce Wayne gelou. Ficou pálido que nem cera:
- Vossa eminência, faça o favor de entrar! Boa Noite, boa noite!
Aproximou-se de Roberto e beijou-lhe a mão, tentando controlar os nervos:
- Sua Santidade, faça o favor de se sentar! Que honra recebê-lo em minha humilde casa, O que fiz para merecer a sua presença?
Sem qualquer expressão, Roberto disse:
- Êu sêi qui foi você quém mi atrôpelôu, seu sácâna!
- Mas, mas, como assim, eu o quê?
- Cômo ássim uma pôrra! Bastou você abrir á bôca prá eu reconhecê você! Ágora venho áqui para lhe cobrar o que me fêz, seu êstropício!
- Pronto, eu... admito. Mas estou tão arrependido! Só que na altura, no calor da situação, só pensei na minha reputação.... tenho pesadelos todas as noites desde então...
- Cále-se! Já lhe disse que vim para cobrar di você! E você vai pagar, senão sua rêputação vai pêlo cano, ouviu?
- Certo, certo, qualquer coisa. Deixe-me passar-lhe um cheque, diga o valor por favor!
- Dinhêro? Por quêm você me toma, seu babáca?
- Claro, que parvo sou... Que posso então fazer? Talvez como Batman, eu possa...
- Cále-se ! Você vai pagar e é ágora!
Roberto abriu uma garrafa de vinho. Desligou o interruptor da luz e enquanto desapertava o cinto, disse:
- Rêparou como anoiteceu di repênti?
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